quinta-feira, 28 de julho de 2011

Tentativa de Fado 27.07.2011



Tenho muita vontade
de sair deste compasso
cantado por uma voz
que vai marcando o ritmo
ao qual não consigo
acertar o passo.

Tenho muita vontade
de dizer que sim
de não temer
o que não existe
de dizer que sim
que esse medo
chegou ao fim.

Tenho muita vontade.

Acordo 27.07.2011

Acordo
e obrigo-me a levantar
Imediatamente
ocupas o espaço
que antes era meu
nosso
Atravessas-te fulminante
morena
que nem cor em tela
numa posição que só tu conheces
Apegas-te a mim
doce
incluis-me no teu sono
e o que eu quero mesmo é
ficar

22.07.2011

Desço para apertar o atacador
mas isso é apenas
uma desculpa.
Pesam-me os ombros
e, quero descer,
sentar-me.
Não há lugares
não há lugar para mim
eu sei que não.

Nomes 06.06.2011

Eu tenho muitos nomes
mas alguns guardo-os
só para mim.
Queria criar um nome
que fosse que nem o vento
e afastasse o que não importa
e me trouxesse de volta

segunda-feira, 25 de julho de 2011

As três portas 25.07.2011

As três portas que me
apareceram à frente
são um segredo bem guardado,
como este poema
que trago no meu
bolso esquerdo,
contorno de coração.
Trago que bebo de uma vez.
Coração acompanha-me
e esquece
a falta de jeito
de tudo o resto
esquece a falta que tu me fazes
e fica aqui.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Lisboa-Londres 20.07.2011

Estou a olhar para a minha chávena de café que tem escrito ‘Lisboa-London’. E é nisso mesmo que estava a pensar. Nessas duas cidades.
Uma é parte da minha família. A outra não.
Uma entristece-me quando me deixa, a outra enfurece-me. Para uma tenho toda a paciência do mundo e não me permito estar sem lhe falar. À outra fico dias sem lhe dirigir uma palavra.
Umas pessoas chegaram agora ao café onde estou e dirigem-se logo ao balcão, outras sentam-se nas mesas. Não pára de chegar gente, todos se conhecem, todos se cumprimentam.
Sandes de fiambre, de queijo, mistas, panados, pastéis de nata, delícias folhadas e muitos galões depois, o movimento no café não pára. É uma mina de ouro. E hoje é quarta-feira apenas.
Lá fora chove e calor não está. Mal saia desta porta sei que vou sentir frio. Não só porque a temperatura está baixa, mas porque vou sair do conforto que me dá este pedaço de casa transformado em café pingado.
Daqui vou para o sul ver o meu Benfica. No fundo, estas horas que faltam até ao jogo não são mais do que longos minutos que arrastam os meus olhos até ao ecrã de televisão transmintindo a partida mais logo.
Está a chover. Parece impossível tanta chuva, tantos dias.
A minha chávena tem um desenho da Torre de Belém. Belém fica na minha casa, na minha Lisboa. Quando parti sabia que seria difícil voltar, porque tal como já respondi mil vezes ‘não foi pelo trabalho, não foi pelos estudos, não foi decididamente pelo clima’, foi porque queria ir.
Aqui neste café de paredes forradas a azulejo sem nada de típico excepto as caravelas pintadas a azul relembrando tempos de glória, os bolos são reis. Os bolos trazem as pessoas aqui. As mesas e cadeiras são desconfortáveis e gastas. De cada vez que alguém se levanta o ferro da cadeira arranha o chão e obriga-nos a olhar para aquela pessoa que nos olha de volta desconfiada. Todos sabemos que os portugueses adoram olhar fixamente para as outras pessoas à sua volta, mas quando olhamos de volta os seus olhos respondem-nos, como que dizendo ‘tás a olhar pá onde?!’ Contraditório?!
Ora de contraditório tem este meu povo e muito. Adoram-se enquanto povo, adoram-se enquanto gente que se sente como ninguém, mas são os primeiros a afirmar os seus defeitos como um grito que não podia esperar.
Ora agora chegou mais uma senhora de casaco de malha salmão contrariando o preto da minha t-shirt. Esta senhora é a terceira pessoa a oferecer uma bica à senhora que está sentada ao meu lado. Aqui, tal como na Grécia, a generosidade é rainha. Quando estive na Grécia compraram-nos uma cerveja simplesmente porque demos as cadeiras que tinhamos a mais na nossa mesa. Três euros e meio por meio litro de generosidade. Aqui em Londres nunca vi ninguém oferecer-se para me pagar um café. Cada um paga o seu. Em Portugal posso pagar uma rodada de cerveja com dez euros e ter troco para duas pastilhas. Aqui não.
Os miúdos e miúdas à minha volta deliciam-se com os seus palmiéres recheados, pães de leite com manteiga e fiambre e galões.
Percebi agora que muitas das pessoas à minha volta estão de malas feitas, bagageiras do carro recheadas e sorrisos feitos porque Agosto está a chegar. Hoje é dia vinte de Julho e Agosto, o mês mais esperado do ano, está a chegar. As crianças vão mais cedo ter com os avós e os pais vão lá ter logo que possam. Lá é Portugal. Lá é o Verão na aldeia e a semaninha no Algarve. Lá é o calor garantido, o vinho de litro, o peixe grelhado, as caras antigas do mercado da Quarteira e a certeza Católica do Padre da Freguesia que lidera a Procissão.
O tema do momento é em que dia vão de férias. ‘Eu vou a 2 de Agosto’- diz uma; ‘eu vou mais cedo este ano para evitar o trânsito’ diz outra.
Olho para o relógio, faltam cerca de três horas para o jogo.
Chegou mais uma senhora que invariavelmente ofereceu uma rodada de bicas à mesa ao lado. Se a minha vizinha de café tem aceite todas as bicas que lhe ofereceram já tinha bebido pelo menos cinco cafés!
A sua neta já comeu dois pastéis de nata e uma sandes de fiambre. A avó diz que a miúda ‘só come come come e depois queixa-se que ‘tá gorda!’.
O rapaz que trabalha aqui no café desabafa que está a ficar sem bateria no telemóvel, imediatamente a minha vizinha pergunta se é o iphone4, ao que o rapaz responde que sim. De imediato se levanta e diz que vai ao carro buscar o carregador para lhe emprestar.
Que povo mais generoso este povo meu!
Chegou mais uma senhora, mais dois beijinhos, mais uma oferta de bica. Já vão seis! A outra senhora diz que hoje já bebeu três cafés, ‘beba um suminho então’ responde a vizinha. ‘Eu ando a descafeinados’ responde a outra.
Chegou uma rapariga que de imediato é interrogada pela minha mesa vizinha: ‘a que horas terminaste o trabalho, para onde vais, de onde vens, onde está a tua mãe’, entre muitas outras perguntas. A última pergunta claro ‘então a que horas vais à missa logo?’.
São quatro e trinta e nove e os empregados do café já começaram a limpar o balcão. O balcão do café está recheado dos ‘melhores bolos portugueses de Londres’ e de miniaturas e enfeites de bolos de casamento.
Ao telefone ao meu lado está uma senhora a falar com a Nela, aparentemente a melhor cabeleireira do bairro. Não sei o que disse a Nela, mas a resposta é uma efusiva beijoca. Ora se é a melhor cabeleireira do bairro merece uma bela beijoca. Agora é a Celeste que está ao telefone com a Nela ‘diz amor, quando é que ‘tás livre para ir aí fazer as raízes?’.
Generoso e carinhoso este meu povo.
No entretanto, os pastéis de nata saem que nem pães quentes. São tantos portugueses como estrangeiros, sim porque os ingleses quando em território/café português são estrangeiros, que vêm a este café comprar bolos e beber galões.
Eu aqui não sou prata da casa como no sul, porque estou no oeste da cidade. Não sou imediatamente identificada como portuguesa pelos meus, no café não sabem se me hão-de falar em português ou inglês, mas esta carinha de portuguesa não mente. Esta pele morena e sorriso lusitano herdado das minhas avós não deixa lugar a dúvidas.
Chegou um senhor de fato bem passadinho a ferro, bigode, batendo com as chaves no balcão de metal exigindo um café, rasga o pacote de açúcar e depois de o esvaziar efusivamente na chávena, amaça-o e aponta ao caixote do lixo que está por detrás do balcão. Falha o alvo claro, mas também ninguém se importa de apanhar o pacote do chão. A conversa, que é o mais importante, continua. Este senhor quando chegou dirigiu-se imediatamente ao extremo do balcão, onde a ‘realeza’ vive. No fim do balcão estão os ‘habitués’, os que cansados do dia de trabalho bebem uma bica com mais determinação que o resto de nós e quando prontos para pagar esvaziam os bolsos de trocos, deixando o balcão vestido de moedas pequenas que surpreendentemente se juntam para pagar a conta.
Eu também sempre quis chegar ao balcão, pedir uma bica como se estivesse zangada, arrancar o troco do bolso, insultar o balcão com as moedas, beber a bica e dizer ‘até amanhã’ como se todos me devessem e ninguém me pagasse.
A mim ninguém me perdoa os ataques de raiva que são cada vez menos. É-me aceite que seja assim, desde que não o expresse.
Chegou agora uma senhora com uma camisola pelas costas. Lembra-me a minha mãe que, mesmo em Agosto no Algarve anda sempre de camisolinha pelas costas porque ‘nunca se sabe e o ar condicionado dá-me cabo da garganta e as correntes de ar e tal’.
Povo generoso, carinhoso e prevenido este meu povo.
Gerou-se uma discussão aqui no café. O Júlio quer pagar os três cafés e a Betinha não quer deixar. Mais um acto de extrema generosidade. A Betinha está determinada ‘ó Júlio ‘tás-te a passar se achas que vais pagar a conta... outra vez!’ e eu ainda não percebi afinal quem vai dar conta da despesa.
A minha conta pago eu, isso de certeza. É o que dá ser da zona sul e vir beber cafés ao oeste. Garanto-vos que mais logo pelo menos uma cervejinha bebo de graça ou um suminho ou uma meia de leite, ‘escolha menina’.
Faltam duas horas e meia até à partida. Não me está a apetecer apanhar o metro, de modo que tenho que ir ver que autocarros me levam ao sul.
Uma tarde e noite passada sozinha, mas entre os meus. Convenço-me eu de que estes estranhos à minha volta têm algo em comum comigo para além de uma identidade, de um lugar de nascimento. Ilusão ou não, faz sentido.
Logo, para celebrar o ínicio da época futebolística, talvez coma uma omelete de camarão. Normalmente seria de queijo, mas hoje é o primeiro dia do resto da época. E o resto da época merece com certeza um toque de marisco.
As minhas vizinhas de café foram embora agora e, desde o momento em que se levantaram e disseram que iam embora, de darem os dois beijinhos ao resto do café, de dizerem até logo, de desejarem boas férias, já passou pelo menos meia hora. Meia hora em que se podia estar a trabalhar, diria o meu irmão.
Está na hora de eu ir pregar para outra freguesia.

sábado, 9 de julho de 2011

Acordei 09.07.2011

Acordei
e, como que sentindo
a nossa falta
naquelas praias
que fizemos nossas,
enchi a banheira de água
e sal
e enfiei lá os pés
extraordinariamente cansados.
Não sei se exaustos
por serem eles
que carregam
todas as emoções boas
que têm sido muitas.
Não sei se pesados
para me lembrarem
do muito que o meu
coração e mente
caminharam.
Quando toquei o sal,
vestido de refinado
disfarçado de mar
senti outra vez o quente
nas nossas caras
e a tua mão pintada de areia
procurando
o meu dedo mindinho.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Não sabia

Não sabia,
de verdade que não sabia.
Podia ter desconfiado,
mas isso não seria mais
do que a minha imaginação.
Sem essa imaginação
também nunca teria ido
a lado nenhum.
Mesmo que soubesse
mesmo que tivesse
imaginado
nunca teria adivinhado
o que aconteceu depois.
E hoje é 3 de Julho
outra vez.
Como uma onda,
livre das demais,
trazes-me um sorriso
e tantas outras coisas boas.
E hoje é 3 de Julho
outra vez.

O nosso romance 22.06.2011

A minha mente reflecte
o nosso romance sem fim
casas brancas
de silhuetas azuis
portas pequenas
por onde nem o meu coração
passa
de tão cheio está.
Mar que não rejeita ninguém
calmo
corajoso de tão amplo.
O nosso romance sem fim
vivido
entre abraços nus
e coisas que não esqueço mais.